17 de mai. de 2015

D/s: Uma Relação de Cumplicidade

Parte I


O último texto que postei na net rendeu muitos comentários que me deixaram feliz. Ele cumpriu o papel de incitar a participação das pessoas. Hoje em dia, as redes sociais, que poderiam ser usadas de uma forma bem mais educativa e lúdica, infelizmente, cumprem apenas o papel de aproximar pessoas.  

Quando escrevo e publico um texto, como foi a “Nova Modalidade de Dominador – O Dono Babá”, não esperava que todos ou a maioria concordasse comigo. Já dizia o escritor Nelson Rodrigues: 


“Toda unanimidade é burra.
Quem pensa com a unanimidade 
não precisa pensar.”

Tenho pra mim que das principais e nobres tarefas do ser humano na vida são aprender, ensinar, gerar discussões para, através delas, trazer à tona novas idéias e ampliar o conhecimento.

A sabedoria nos manda estar prontos para aprender e ensinar. Não importa a idade, o gênero, o status cultural ou social. Não importa se PhD, ou analfabeto, a vida nos dá, a todos, condições para aprender e ensinar. A gente aprende até com os imbecis, que estão por aí nos dando lições de “como não devemos ser”.

E só não aprendem os que estão cristalizados e os arrogantes, que pensam saber tudo e mais do que todo mundo. Estes preferem se manter na escuridão.

Quando critico a submissão que se alastra pela rede como um tsunami, oriunda dos 50 Tons é porque sei o que estou falando. E. L. James fez um desserviço para o BDSM. Mexeu covardemente no imaginário feminino de todas as idades e status social, que crêem ser possível uma relação feita de cinderelas e príncipes encantados.

Estou no BDSM desde 1998 e digo honestamente a vcs que o milagre não é assim que acontecerá. O milagre é quando as pessoas se atraem, se identificam, se respeitam e levam a relação com alegria, leveza, responsabilidade e ética.

Vejam: submissas existem para dar prazer e não trabalho. Se genuínas, dão prazer e, conseqüentemente, sentem prazer com isto. É assim que se dá o autêntico D/s. O Dono dita as regras, o sub corre e faz. Quando encontra uma dificuldade, cabe ao Dominador estudar a forma como aquele problema será equacionado. Erros serão passíveis de correção e desvios, passíveis de punição que deverá ser cuidadosamente pensada.


Aqueles que leram “1984”, do escritor George Orwel, devem lembrar-se de como o Estado escolhia torturar os desobedientes. Eles estudavam aquilo que provocava maior pavor em cada um. A pena nunca era a mesma para todos.

Eu sou masoquista. Tanto a dor física me excita, quanto o medo, a humilhação, a degradação, a mágoa... até os ciúmes me excitam... podem acreditar. Mesmo assim, garanto que tenho lá minhas dificuldades. E isto não é nenhuma vergonha... Afinal, somos, todos, frágeis criaturas em nossa imperfeita humanidade.

Não tenho nenhuma presunção de ser perfeita. Sei que não sou e que jamais serei.  Perfeito é o DONO. ELE que Domina e dita as regras. A mim cabe obedecê-las e satisfazer seu prazer. Quando isto não acontece... ah... nem queiram imaginar. O DONO não usa a alcunha de DIABLO à toa. O preço que pago é muito alto e eu posso garantir que é um tipo de dor que não desejo: o silêncio e a ausência. 

Vocês devem estar se perguntando por que então não obedeço de pronto. Explico: como toda pessoa, no BDSM ou fora dele, também tenho minhas dificuldades, que para alguns podem até ser bobas, mas que para mim são grandes limitações, mesmo que eu nunca diga, pq não diria um “Não” para aquele que tem nas mãos a guia da minha coleira. 

Voltando às críticas, é preciso lembrar que eu, Amar Yasmine SD, há tanto tempo nisso, também preciso que o DONO cuide de mim. Cuidar é uma tarefa do Dominador. Só não precisamos alardear isso aos quatro ventos como uma pré-condição. 
E este “cuidar” deve estar implícito como “tarefa” do Dominador. A submissa que for realmente submissa, terá em sua consciência:


“Se não cuido eu mesma de mim,
como exigir que o outro cuide?”

Se “cuidar” é uma tarefa implícita ao Dono, “aliviá-lo” de qualquer trabalho deverá ser uma tarefa implícita à quem se submete e a isto eu chamo “relação de cumplicidade”... como bem disse Rubem Alves em seu livro “O Retorno e Terno”. 

Afirma o escritor que existem dois jogos parecidíssimos: O Tênis e o Frescobol. Em ambos, dois jogadores interagem com raquetes e uma bola, num campo dividido ao meio por uma rede. O que difere um jogo do outro são as regras. No Tênis, deve-se derrotar o adversário. No Frescobol os participantes visam o acerto do outro.

Assim deve ser o D/s, uma relação de cumplicidade, como o Frescobol, onde Dominadores e submissos, cumprindo conscientemente os respectivos papeis, joguem um para que o outro jamais erre e, assim, a relação só poderá sair ganhando.




Amar Yasmine SD

Em breve:

D/s: Uma Relação de Cumplicidade
Parte II