Costuma-se falar dos prazeres e das dores da entrega, pois, é o que nela há de mais forte e evidente. O prazer que encontro na submissão é o maior que já encontrei em termos eróticos, e as dores são igualmente intensas. Entretanto, toda essa intensidade mexe muito com o nosso emocional e, embora as nossas emoções estejam sempre em pauta, existem também os surtos, dos quais pouco se fala.
É, eles acontecem! E é pelos mais variados motivos.
Acredito que, em algum momento, toda sub tenha surtado ou venha a fazê-lo.
Estamos em contato com emoções das mais intensas e nem sempre é algo simples mantê-las sob controle. Por vezes é impossível não sair dos eixos da razão e derrapar numa das curvas da emoção.
"Um surto ou crise emocional pode se manifestar de diferentes formas, mas, de forma geral, entende-se como sendo uma reação do sujeito frente a um acontecimento em que não se sinta preparado emocionalmente para enfrentar. É muito comum em vivências que exigem do sujeito adaptação. Dessa forma, as crises não são, necessariamente, algo ruim ou prejudicial à vida do sujeito. Ela pode ser um processo de autoconhecimento e fortalecimento pessoal."
Logo em meu primeiro contato com o meio BDSM, passei por um momento dos mais difíceis.
Eu estava maravilhada com tudo que descobria sobre submissão, em estado constante de tesão à flor da pele e sob restrição de orgasmo, com tudo isso junto e ainda sem saber lidar com as novas e intensas sensações que se apoderavam de mim, tive um surto que a princípio foi assustador, revelador mais adiante.
A sensação era de que enlouqueceria e não voltaria mais ao normal. E, em parte é verdade, depois de conhecer a submissão não se retorna mesmo ao estado anterior. Ainda assim, aquele misto de sensações formava uma grande confusão mental, algo desesperador.
Um depoimento
Certo dia, adormeci brevemente no sofá da sala, havia apenas eu e mais um familiar em casa. Não me lembro de ter tido sonho erótico, é comum despertar mexida depois deles. Acordei me esfregando no sofá e quase gozando. Mal podendo me mexer, senão, gozaria ali mesmo, eu tentava sair logo dali, precisava ficar sozinha pra me recompor. Mas a cada tentativa de me mover, uma onda de tesão tomava conta do meu corpo. Sem saber o que fazer, fiquei imóvel por um tempo e com as mãos tampando os rosto, pois, o tesão, a vergonha e a vontade de chorar estavam estampados nele, respirei fundo e, mesmo sem muita firmeza nas pernas, consegui chegar até o banheiro, que se tornou meu refúgio.
Entrei embaixo do chuveiro, a ideia era que a água me acalmaria. Ela em nada ajudava, junto com ela, desciam as lágrimas e lavar as partes íntimas era impossível, pois, tocá-las, só fazia aumentar o tesão. O interessante era que masturbação sequer me vinha à mente O desespero era tamanho que eu não raciocinava, havia o choro copioso, os murros na parede, a raiva, vergonha, culpa, medo de enlouquecer...
Depois de várias tentativas frustradas de retornar à sala e encarar a pessoa que acompanhava àquela cena patética, finalmente consegui dizer-lhe algumas palavras. Não adiantava explicar, alguém de fora jamais entenderia a situação, eu mesma não entendia.
Ainda em estado deplorável e sem conseguir dizer o que estava acontecendo, enviei mensagens ao Interessado desistindo de tudo, porque estava enlouquecendo e não podia viver daquela forma, enfim, enviei-lhe um texto incompreensível. Enviei essa e várias outras mensagens sem conseguir dizer tudo que deveria ser dito. Tendo finalmente recobrado o juízo, expliquei tudo.
Resumindo, eu surtei mas, foi à partir daí que comecei a compreender o que é ser submissa. Teria sido tão mais fácil se eu o tivesse desobedecido e, na época, me questionei bastante por não tê-lo feito, já que evitaria vários transtornos.
Tempos depois, entendi que obedecer é difícil, mas desobedecer ao Dono é ainda mais difícil, e que, esse sentimento submisso é mais forte que eu, mais forte que a razão e que não dá pra fugir dele, pois, ele é parte de mim. Não é à toa que existe uma frase (desculpem , não sei a autoria) que diz; "Obedecer é difícil , por isso eu faço".
Esse foi o primeiro de outros surtos que ainda viriam, mas que fazem parte da vivência submissa .
É nosso crescimento, nossa luta interna entre o que se pode e o que se deve, mas que nos torna melhores e mais fortes.
luah negra